Jan 24, 2009

A melhor escola no chão

Reportagem

É como se um meteorito gigante tivesse caído e esmagado a Escola Americana Internacional de Gaza. Com investimento palestiniano e curriculum americano, era a melhor escola do território, e agora professores e alunos andam entre as ruínas em estado de choque.

Uma mulher encontra um livro de Ciência e agarra-o contra o peito. É Alia, a bibliotecária. Fatin, uma das professoras, abraça Zena, de nove anos, ambas voltadas para os destroços. "Isto aconteceu no dia 3 de Janeiro."

Porquê aqui, se à volta não há nada? "Pergunte-lhes", sugere Fatin.

"O corpo do guarda foi encontrado em partes, uma metade aqui na frente, outra metade nas traseiras."Quantos alunos tem a escola? "230", responde logo, num óptimo inglês, a pequena Zena, que mora em Gaza, e até hoje não tem vidro nas janelas.

O que fazem para não ter frio? "Vestimos mais roupas."

"Agora não sabemos o que fazer aos estudantes", diz Fatin. Duas delas estão ao cimo das escadas a discutir. Nur, que tem rabo-de-cavalo e 14 anos, está indignada. "Usam as casas para disparar rockets e se as pessoas não querem têm que deixar a sua casa!"

Depois conta que uma das suas melhores amigas morreu na guerra, até que a voz lhe falta, ela baixa a cabeça para se controlar, e começam a pingar lágrimas do nariz.

Fatin, a professora, corre a abraçá-la, e então Nur chora convulsivamente. Quando recupera, diz: "Estou muito zangada com o Hamas. Acho que isto tudo aconteceu por causa dos rockets".

À volta, as colegas contestam. "Não é por causa dos rockets que Israel tem o direito de destruir uma escola destas", clama Habir, de 16 anos. "Eles querem destruir tudo o que é novo, histórico, educacional. Isto é um crime."

Dana, de 16 anos com muito acne, concorda, e Habir continua, apaixonadamente. "Se isto é contra o Hamas, porque é que tantos mortos não são do Hamas? E dizem que se estão a defender! Defendem-se de uns rockets que são uma desculpa, só causam um buraco no chão."

Esta discussão sobre o papel do Hamas é geral? "Estamos a discutir desde o princípio da guerra. É difícil não questionar quando não podemos dormir e ir a qualquer lado, e estão a usar armas do céu, da terra e do mar contra nós."

O que querem agora?"Queremos um governo de unidade nacional", diz Habir. "Só queremos continuar a estudar nesta escola", acrescenta um rapaz, Adam, que veio com os colegas ver a destruição. "Trabalhámos tanto para isto acabar assim."

Yunis, de 18 anos, aparece de chinelos numa pilha de entulho. É irmão do guarda morto. Conta que o pai teve um primeiro filho Salim, que foi morto há anos, e um segundo filho Salim, que morreu - e o terceiro filho Salim era o guarda que foi desfeito em pedaços aqui. Israel alega que estavam a ser disparados tiros do interior. "Mas a escola estava vazia, e se estivesse aqui alguém o guarda tinha-nos dito", contrapõe Lucy, outra professora. "Eu acordei às três da manhã com o primeiro míssil e antes não ouvi nada", acrescenta o irmão do guarda. "O meu irmão sentia-se seguro, porque era uma escola americana. Antes de morrer, telefonou à família e disse: 'Se sentirem perigo, venham para aqui'."

A.L.C., em Gaza

(publicado em 24 de Janeiro na edição impressa do Público)

1 comment:

Anonymous said...

Por falar em crianças, lembrei-me de um vídeo que achei muito interessante. A UNICEF está a par disto? http://www.youtube.com/watch?v=eTGbP55HGi8